sábado, 2 de outubro de 2010

Retratos da situação política às vésperas das eleições: Política e Geografia, por Felipe Cavalcanti

A motivação em escrever as breves análises e opiniões sobre esse tema não vem de hoje. Entretanto, no dia que antecede ao comumente chamado o exercício democrático por excelência, o pleito eleitoral, a colocação de algumas reflexões parecem bastante oportunas de serem colocadas, pensadas e debatidas. Enquanto geógrafo, me parece importante pensar a política independentimente de sua situação de estabilidade ou crise, uma vez que a meu ver o cerne da geografia se encontra na política, não só aquela do Estado-Nação, mas também nas esferas imediatas do cotidiano do homem e toda a complexidade das inúmeras instâncias e escalas das relações de poder que se manifestam espacialmente. A questão é que mesmo se considerando as formas de poder nas relações mais gerais entre cada um de nós, a tônica para se discutir uma política institucional se torna eminente, pois estamos há poucas horas das eleições, e o governo que reger-nos-ão afetará não só a política institucional do Estado, como também outras muitas demais formas de poder, em um maior ou menor grau. A geografia, por ser a ciência que estuda o espaço da morada do homem - a superfície terrestre - e a construção de sua espacialidade deve entender os sujeitos, estes homens e mulheres, que antes de tudo são socialmente dispostos e se organizam em sociedade uma vez que mediados pela política, o público, o coletivo, sintetizados no chamado contrato social. É por isso que para a geografia e para os geógrafos se torna fundamental se falar de política, sobremaneira em tempo de eleições, com o agravante de serem ainda - não só, mas também - eleições presidenciais.
Infelizmente, a concepção de política hoje se encontra profundamente esvaziada. Enquanto nossos representates se orgulham - em um profundo ufanismo - em dizer que o Brasil é um dos países mais democráticos do globo, parece não ser muito importante para eles discutir uma questão central: Afinal, o que é a democracia? Hoje, podemos, ainda que de forma grosseira e generalizada, dizer que a democracia, segundo os óculos do governo, é sinônimo de representação. Esta (con)fusão democracia-representação está tão arraigada e inculcada em todos nós, que não raro não atentamos para esse fato. Enquanto isso, nós só depositamos na urna os votos naqueles que acreditamos que representar-nos-ão melhor. No ato de representar encontramos uma ambiguidade: a de tranferir os poderes particulares à um poder de governança mais restrito e legítimo, enquanto socialmente aceito pelo contrato; como também o de representar tal como um ator, logo, atuando e simulando certas coisas. Então, via regra, votamos com o primeiro sentido da representação (transferência de poder) e não raro, nossos "representantes" atuam de forma a conceder privilégios à uma elite e promessas que não se concretizam às massas. Conforme aprendi com um brilhante professor, se fosse possível um antigo grego olhar para a nossa democracia, certamente ele diria que erramos no conceito. Diria que estamos em uma aristocracia, uma vez que é o governo dos melhores. Assim como quando vamos ao médico, queremos ser atendido pelo melhor, queremos o melhor professor, o melhor para as nossas vidas, igualmente vamos querer o melhor governo na direção do Estado. Para aqueles gregos de Atenas, a democracia representa deliberação pública na ágora por parte de todos seus concidadãos, se configurando assim um auto-governo das massas. É bem provável que ninguém duvide a impossibilidade de se viver politicamente como os gregos, quando temos hoje, milhares de anos após e no Brasil, uma população que se mede na casa dos milhões. População essa que como diziam Michels, Paretto e Mosca (a corrente elitista) está dividida em massas e elites e na visão destes, a história representa um "cemitério de elites" como o mesmo professor - Renato Lessa - explicava em suas brilhantes aulas. Cemitérios pois a elite se conservava no poder, podendo ter a sua hegemonia colocada em xeque por uma contra-elite. Mas nesse conflito que resulta em uma instabilidade, caso a contra-elite saia vencedora, sairá do conflito enquanto elite hegemônica. O que questiono aqui é a falta de ação política por parte da população como um todo. A falta de participação é tão intensa que se traduz até no termo política, uma vez que ao ouvir a palavra "política", imediatamente associamos à esfera da política institucional, como algo alheio de nós. Enquanto não participarmos de forma menos limitada, enquanto não se tiver comida para todos, enquanto não se tiver casas e condições dignas para todos, não podemos falar em democracia. Assim como não podemos entender a democracia em toda sua plenitude enquanto acreditarmos que somos cidadãos uma vez a cada dois anos e aceitar - como é conveniente para o governo e ele assim quer que o seja - que as eleições são a maior festa democrática do país. Eu me pergunto que outra "festa" democrática que nós somos convidados, ou intimados a comparecer? A própria obrigação de se votar já não feriria esta mesma democracia? O que consigo apreender é que este ano o espírito da eleição está sem dúvida festivo: Enfeites excessivos que tentam nos convencer ou nos coagir a votar naqueles candidatos e segundo, até mesmo o palhaço está na festa, concorrendo a disputa para deputado federal. Três vivas para o palhaço Tiririca. Viva o pior que tá não fica. Viva, seja lá o que for o que faz o deputado federal. Viva o voto de protesto no palhaço, a democracia. E quanta hipocrisia!
A descrença na política parace se acentuar mais e mais, enquanto nas ruas se vê mais propagandas, uma verdadeira poluição visual da paisagem. Contradição bizarra essa: A política se encontra profundamente desacreditada e se apela em propaganda em cima de tal descrença. Nunca antes eu havia visto tantos panfletos e cartazes nas ruas do meu bairro. As propagandas não eram nem mesma retiradas durante a madrugada, estão lá 24 horas por dia! Somado a essa falta de credibilidade para com a política, vemos candidatos dos mais estapafúrdios e com as propagandas mais absurdas pedindo nossos votos. Pior ainda, não raro escuto dizer que quem votará neste tipo de candidatos o fará como voto de protesto. Um completo absurdo! Não consigo conceber tal forma de protesto, seria isto sim, um atestado de incompreensão e falta de politização crítica.
Talvez eu possa propor que nossa pseudo-democracia é fruto do projeto de uma ditadura que não tinha mais o apoio para se manter como tal, no poder. O milagre foi por água a baixo, com isso a classe média descobria que a ditadura praticava torturas e perseguia opositores políticos, promovia atentados. Assim o regime militar perde seus pilares de sustentação. Mas a abertura (política) foi lenta, gradual e segura, como queria Geisel. A anistia foi ampla, geral e irrestrita. Todo o caminho rumo à democracia era trilhado pela ditadura. E o que dizer do último militar no poder, Figueiredo, que declarou que levaria o país a democracia, nem que tivesse que ser na base da porrada? Quer queiramos, quer não, essa é a nossa herança democrática. No meu olhar como geógrafo, atento para a questão da educação e em particular, é claro, a geografia. Foi na ditadura militar que a geografia virou estudos social, junto com a história, para o ensino fundamental. O currículo escolar ainda acrescentava educação moral e cívica para atender aos auspícios militares criando um sentimento ufanista desde a tenra idade. A geografia, por sua vez tinha que estar ao serviço do regime, e assim estaria sendo somente se fosse desinteressada, despolitizada, neutra, que decora o nome dos rios e das capitais, ou simplesmente "simplória e enfadonha", como diz Lacoste. Mas como essa geografia ajudaria ao sistema se apresentando deste modo? O mesmo Lacoste nos dá a pista. Diz ele que essa geografia tem de parecer nada interessante para camuflar e obscurecer seu real significado. "A geografia - Isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra". Quem faz a guerra é o Estado e nela se precisa conhecer o espaço de forma estratégica, foi assim que surgiu a geografia, para atender ao Estado. Mas, tanto como a geografia não serve so para fazer a guerra, ela então pode servir ao Estado de outras formas, ocultando essa sua face nas escolas. No contexto de uma ditadura militar, se falar de política é extremamente inconveniente. Mas como fazer com a geografia, que é um conhecimento essencialmente político na observação e decifragem do espaço do homem? A resposta foi dada camuflando o "real propósito" da geografia, que surge da guerra, da estratégia. Estranhamente, não é raro ouvir-se dizer que na época da ditarua a escola pública era de qualidade, entretanto, mesmo que tal postulado seja verdadeiro, a educação não poderia ser crítica. Hoje o quadro se inverte. Em razão da possibilidade da educação pública ser crítica, ela é sucateada e degradada, o que resulta na mesma falta de consciência política. O que muda é tão somente a natureza das restrições. Enquanto na ditadura a restrição era explícita, em nossa democracia ela é dissimulada, alegando-se falta de recursos para investimentos na educação. Um dos principais desafios da geografia hoje é servir à sociedade, contra as injustiças praticadas pelo Estado e por seus privilegiados.
Eis que os jovens, tanto os que foram na ditadura quanto os de hoje, em sua grande maioria desconhece um dos prpósitos encantadores da geografia: a política. A escola, enquanto organização do governo da qual depende a maioria dos estudantes não os formou de forma crítica e de forma politizada. Amanhã, eles assim como nós votaremos e nossas opções não são muito das melhores. Na verdade, eu particularmente acho que nunca se teve tantos absurdos e descrença na política. Basta olharmos para alguns de candidatos. Tiririca, mulher melão, Romário, Bebeto. Tem para todos os gostos, palhaços, mulher fruta, esportistas.
Por fim, cabe salientar que a geografia, assim como a política não tem nada de neutra como alguns querem que no contrário se acredite. Cabe a nós decidirmos e nos orientarmos explicitamente com relação a nossas escolhas, essa seria a ética mais apropriada quando se entende a inexistência da neutralidade. É por isso que eu destaco um candidato que só veio a me surpreender e acreditar na mudança, em um mundo melhor, na polítização e no espírito de transformação dos jovens. O candidato a presidência Plínio Sampaio, foi o que me pareceu mais coerente e fiel aos seus princípios, a sua luta e ao seu partido.

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